Quando o Supremo cala, a Justiça se cala

Picture of Huendel Rolim, Mestre em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito, Advogado.

Huendel Rolim, Mestre em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito, Advogado.

Quando o Supremo cala, a Justiça se cala

Para que a Justiça seja Cega, a Advocacia não pode ficar Muda

Compartilhe:

Nos últimos tempos, temos presenciado uma escalada de tensão entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre um tema essencial para a advocacia: o direito de sustentação oral. Este debate acirrado, fomentado por decisões como a do ministro Alexandre de Moraes, que há alguns meses negou a sustentação oral em um julgamento de grande repercussão, toca no cerne da prática jurídica e na essência da justiça.

A palavra, no exercício da advocacia, não é apenas um meio de comunicação; é a própria ferramenta de trabalho do advogado. Quando nossa voz é silenciada, perde-se uma parte fundamental do processo democrático de debate e argumentação, comprometendo a imparcialidade na análise dos fatos.

A decisão proferida pelo Supremo foi revista após pedido do Conselho Federal da OAB, que comemorou a decisão, demonstrando o abismo para o qual a advocacia havia sido lançada. É triste ter que comemorar uma decisão que jamais poderia ter prosperado no mundo jurídico. Não se pode calar a voz do advogado. Efetivamente, vivemos tempos estranhos.

Desse episódio, parece que o Conselho Federal, até então aceitando muitas posições da Corte Superior e até mesmo elogiando posturas que violavam o direito de defesa, resolveu agir para tentar mitigar a mancha que pairou sobre os advogados.

A Lei n. 14.365/2022 passou a assegurar aos profissionais a possibilidade de sustentação oral em diversas situações, inclusive em sede de agravo regimental. Ignorar tal prerrogativa, além de ilegal, é um desrespeito não só à advocacia, mas ao próprio Estado Democrático de Direito.

A postura negacionista dos Tribunais Superiores ao direito de sustentação oral, sob o argumento de prevalência do regimento interno sobre a lei, aponta um contrassenso que pode comprometer a integridade do direito de defesa garantido pela Constituição Federal. O regimento interno dos tribunais, enquanto conjunto de normas estabelecidas para regulamentar a organização e o funcionamento do órgão, não pode se sobrepor à legislação federal que garante o livre exercício da voz do advogado, direito fundamental da classe.

A voz do advogado, como já dito, é indispensável em todos os momentos processuais, pois é por meio dela que se manifestam os direitos e as angústias do cidadão. É alarmante que instituições que deveriam ser o baluarte da defesa dos direitos constitucionais estejam promovendo a limitação de uma prerrogativa tão essencial.

Diante deste cenário, algo inimaginável foi necessário. Neste ano, a OAB aprovou texto de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que será enviado ao Congresso para assegurar a sustentação oral dos profissionais junto aos Tribunais Superiores, já que a norma infraconstitucional não tem sido respeitada. É uma iniciativa louvável, de fato, mas é também lamentável que seja necessária.

Lembro a fala do então Ministro Marco Aurélio, do STF, proferida há dez anos, acerca da postura de um colega no julgamento da denominada AP 470: “Eu completo, dentro de dois dias, 24 anos no Supremo. Nunca vi uma situação semelhante. O regime é um regime essencialmente democrático. E o advogado tem, como estatuto, e estamos sujeitos ao princípio da legalidade, o direito à palavra.”

A advocacia não pode ser tratada como um mero acessório no sistema de justiça. Ela é essencial para a garantia dos direitos dos cidadãos e para a preservação do Estado Democrático de Direito. Faço um apelo aos colegas advogados: não nos calemos diante de injustiças como essa. Continuemos a lutar pelo nosso direito de ser ouvidos e de defender nossos clientes com todas as ferramentas que a lei nos concede. A justiça só existe quando todos têm a chance de ser plenamente ouvidos.

Defender a advocacia é defender a justiça e a democracia. Que nossas vozes sejam sempre respeitadas e que possamos exercer nossa profissão com a dignidade e o respeito que ela merece. Lembrem-se: a palavra não é um capricho; é um direito que assegura a plena defesa e o contraditório. Ao cercear este direito, estamos enfraquecendo a justiça e, consequentemente, a democracia.

Deixe um comentário

Veja Também

Quer ser o primeiro saber? Se increve no canal do PH no WhatsApp