Pessoas que já tiveram dengue podem ter um risco maior de desenvolverem uma infecção mais severa pelo vírus da zika, de acordo com um estudo publicado nesta quinta-feira (23) na revista "Nature Immunology".
Testes feitos por pesquisadores do Imperial College London, do Instituto Pasteur de Paris e da Universidade Mahidol de Bangkok sugerem que os anticorpos desenvolvidos contra a dengue são capazes de reconhecer e se ligar ao zika por causa das similaridades dos vírus (ambos são da família dos flavivírus).
Por um mecanismo chamado de "amplificação dependente de anticorpos", esses anticorpos de dengue pré-existentes são capazes de potencializar a infecção pelo vírus da zika.
É algo similar ao que ocorre com pacientes que são infectados por dengue mais de uma vez, por diferentes sorotipos do vírus: na segunda infecção, o risco de dengue hemorrágica é sempre maior do que na primeira.
Em situações normais, os anticorpos envolvem os vírus ou bactérias, neutralizando esses invasores e possibilitando que o sistema imunológico os destruam. Se o mesmo invasor aparecer novamente, já existem anticorpos treinados para combatê-lo.
Como a dengue possui quatro sorotipos, caso o paciente seja infectado por um segundo sorotipo, o anticorpo já presente no organismo para combater o primeiro tipo de dengue consegue se ligar parcialmente ao segundo tipo, levando-o para as células do sistema imune. Porém, a célula não é capaz de matá-lo e o vírus tem sua replicação potencializada dentro dessas células. É o que também parece ocorrer com quem já teve dengue e posteriomente é infectado por zika.
"Apesar de este trabalho estar em um estágio muito preliminar, ele sugere que a exposição prévia ao vírus da dengue pode potencializar a infecção por zika. Esse pode ser o motivo de o surto atual ser tão severo, e explicar por que ocorreu em áreas onde a dengue é prevalente. Agora precisamos de mais estudos praa confirmar esses achados, e progredir rumo a uma vacina", diz o principal autor da pesquisa, Gavin Screaton, do Imperial College London.
Esperança: vacina contra zika e dengue
O mesmo grupo de pesquisadores chegou a outra conclusão importante: a de que, apesar de a maior parte dos anticporos contra dengue potencializarem a infecção por zika, dois tipos específicos de anticorpos contra dengue avaliados pelos cientistas são capazes de neutralizar o zika. Os resultados desse estudo foram publicados na revista "Nature" também nesta quinta-feira.
Os autores estão estudando a estrutura desses dois anticorpos, o que pode ser um caminho importante para o desenvolvimento de uma vacina que possa funcionar contra zika e contra dengue.
Esta semana, o laboratório farmacêutico Inovio, dos Estados Unidos, e o parceiro GeneOne Life Sciences, da Coreia do Sul, informaram que receberam aprovação de órgãos de regulação norte-americanos para iniciar testes em humanos com uma vacina contra o vírus zika. Esta foi a primeira aprovação para testes em humanos de uma vacina de zika.
Vírus já circula em 61 países
Em fevereiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o vírus da zika como emergência de saúde pública global. O vírus foi associado à microcefalia, uma malformação congênita.
De acordo com boletim da OMS divulgado na semana passada, 61 países e territórios já registram transmissão continuada do vírus da zika. Além disso, outros 10 países tiveram relato de transmissão de zika de indivíduo para indivíduo, provavelmente por via sexual.
O Brasil é o país onde o vírus está mais disseminado, com mais casos de infecção pelo vírus e de microcefalia associada à zika. O país teve 138.108 casos prováveis de zika em 2016 até o dia 7 de maio, segundo o Ministério da Saúde. Em 2016, o país registrou uma morte causada pela doença em um adulto no Rio de Janeiro e, no ano passado, foram 3 mortes de adultos.
Ainda segundo a pasta, são 1.616 casos confirmados de microcefalia desde o início das investigações, em 22 de outubro, até 11 de junho, com 73 mortes de bebês.