Pesquisadores criam banco de dados para subsidiar mapeamento da violência contra a mulher em MT

Foto por: Gabriel Aguiar / Sesp-MT

Pesquisadores criam banco de dados para subsidiar mapeamento da violência contra a mulher em MT

Na próxima segunda-feira (08) comemoramos o Dia Internacional da Mulher e o momento sempre traz reflexões importantes sobre o papel da mulher na sociedade e como ela é vista. Nesse sentido, professores e acadêmicos da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) se debruçam sobre o projeto de pesquisa “Feminicídio e violência de gênero: um estudo sobre a violência de gênero no Mato Grosso” desde 2018 e, atualmente, estão montando um banco de dados que subsidiará o mapeamento da violência no Estado.

O feminicídio, de acordo com os pesquisadores, é uma questão de saúde pública de urgência e que precisa ser compreendido dentro do universo da violência contra a mulher em seu sentido mais estrutural.

O projeto é coordenado pelos professores Renata Lourenço e Marcelo Luís Grassi Beck e conta com o financiamento da Fundação de Amparo a Pesquisa de Mato Grosso.

O projeto foi institucionalizado em 2018 e é desenvolvido junto ao Núcleo de Pesquisa em Ciências Humanas (NECH), compreendendo duas etapas: revisão bibliográfica sobre a temática e coleta de dados junto à Secretaria de Segurança Pública, no Mapa da Violência do DataSus; e a segunda etapa, que está em andamento desde de julho de 2020, que consiste na coleta de dados junto às Delegacias da Mulher, por meio do acesso aos boletins de ocorrências referentes aos anos de 2018 a 2020.

Os dados colhidos irão integrar o banco de dados que subsidiarão o mapeamento da violência e o feminicídio no Estado.

A coordenadora do projeto, professora Renata, explica que esses dados colhidos junto às Delegacias serão trabalhados em três frentes específicas, focando as análises estatísticas sobre os tipos de ocorrências, faixa etária e dados socioeconômicos considerando o montante de ocorrências.

“A segunda frente destina-se a uma análise de dados mais específicos nos casos de violência de lesão grave e feminicídio com o intuito de se traçar o perfil vitima-agressor e a distribuição dessas ocorrências dentro do Estado. A terceira frente busca a compreensão através da análise de conteúdo dos principais fatores que levam as ocorrências e a percepção dos agressores sobre os atos de violência e seus desdobramentos”, explica.

De acordo com a pesquisadora, foi a partir da criação da Lei Maria da Penha que a violência contra a mulher ganhou um novo foco e vem sendo discutida de forma mais abrangente como políticas públicas e não apenas na esfera criminal.

“Um exemplo desse momento atual em que se compreende a necessidade de discutir a violência de gênero, é a aprovação do inciso que qualifica o feminicídio, que nada mais é do que um homicídio doloso (quando há a intenção) praticado contra a mulher por razão da sua condição de sexo feminino. Nesse caso, desconsidera-se a dignidade da vítima enquanto mulher, como se as pessoas do sexo feminino tivessem menos direitos do que as do sexo masculino”, destaca.

Renata acredita, porém, que em uma concepção mais ampla esse é um crime motivado por sentimentos de posse, subordinação e objetificação da mulher, a tal ponto que o agressor se considere no direito de dispor da vida da vítima.

“Isso é muito significativo quando tentamos diferenciar um homicídio contra a mulher de forma geral (femicídio) e o feminicídio de forma específica, tendo em vista que esses conceitos de posse, sujeição estão  entranhados na construção de nosso tecido social e que passam desapercebidos ou naturalizados dentro de um espectro estrutural de culpabilização da vítima pela violência sofrida, pelas limitações e diferenças de acesso ao mercado de trabalho entre tantos outros fatores”, acrescenta.

Para a pesquisadora, essa qualificação do feminicídio é mais um passo para estabelecer mecanismos mais efetivos no combate dos diversos tipos de violência.

“Muito embora não haja, ainda, uma efetividade de acolhimento da vítima de forma integral, temos avançado neste campo através da ação da sociedade civil, das organizações não governamentais e dos movimentos coletivos no empoderamento e representação feminina”, pontua.

Violência X Pandemia

No que diz respeito a relação da violência no período de pandemia, a pesquisadora lembra que é importante analisar alguns fatores importantes.

Renata afirma que sempre que há uma crise social, seja ela econômica, política ou sanitária como a que vemos atualmente, vários fatores sociais ficam exacerbados e diretamente os primeiros direitos questionados são os direitos femininos.

“Somos as primeiras a perder empregos, a criar os filhos sozinhas, a garantir a permanência da família e isso reflete diretamente  no contexto da violência intrafamiliar, pois desloca as atribuições sociais estabelecidas e expõe as mulheres cada vez mais as ações violentas de seus pares. E esses fatores passam a legitimar a violência contra a mulher como uma reação natural do homem às pressões vivenciadas em função da crise”, afirma.

Segundo Renata, é difícil quantificar a influência da pandemia nos índices de violência. Isto porque, segundo ela, esses dados sempre foram subnotificados.

“Existe hoje uma mudança no foco dos casos veiculados na mídia, não mais apenas como um fenômeno de ocorrência entre os mais pobres, mas bastante presente nas camadas socialmente mais privilegiadas economicamente e de grau de instrução, por exemplo. Mesmo assim, é importante lembrar que essa problemática não está restrita  ao Brasil, mas se apresenta de forma global nas diferentes formas de violências e privações de direito”, avalia.

+ Acessados

Veja Também