Entre as lentes da alma e do celular

Entre as lentes da alma e do celular

O acontecimento filmado e narrado no último final de semana em Chapada dos Guimarães, onde vimos um motoqueiro salvar a vida de um rapaz prestes a se matar, nos faz pensar o quanto a sociedade está com sua saúde mental comprometida.

Somos bombardeados diariamente com infinitas informações de todos os assuntos. Perdemos muito tempo em redes sociais e estamos deixando de lado a vida real. Aliado a isso, temos uma crise econômica no país onde milhões de brasileiros tiveram seus empregos perdidos e, consequentemente, sofrem com a queda na qualidade de vida.

Aqueles que têm a graça de ainda ter seu emprego vivem sob pressão intensa e em um nível absurdo de competitividade. Não podemos ignorar também fatores como o abuso de bebidas alcoólicas e de outras drogas lícitas ou ilícitas.

Deixar essa análise no campo apenas espiritual e atribuir a causa dos transtornos mentais à “falta de Deus” chega a ser uma maldade tremenda. Já não bastasse as limitações e negatividade dos pensamentos de quem já está doente, reforça a ideia de que a pessoa doente seja uma amaldiçoada. Isso é praticamente uma inquisição dos tempos modernos.

Na prática, o que devemos fazer é acolher essas pessoas em sofrimento e orientá-las a procurar um profissional, seja ele médico ou psicólogo. Não podemos tratar um assunto dessa complexidade (saúde mental) de forma superficial e sobretudo carregado de preconceitos perpetuados por gerações.

Voltando à situação concreta do rapaz que atentou contra a própria vida, temos que destacar a nobreza de atitude do motoqueiro, pois a lente da sua retina foi imensuravelmente mais sensível que a da câmera do celular. A atitude dele salvou a vida também de quem o filmou e indiretamente nos despertou do quanto estamos todos adoecidos e vivendo no automático.

Espero que a partir dessa situação passemos a ser mais como ele, com as lentes de nossas almas ligadas para salvar quem está ao nosso lado e que muitas vezes não conseguimos enxergar em meio a nossa vida virtual e automática. Liguemos a lente da alma e sejamos mais um “motoqueiro”.

PS.: minha singela homenagem ao Thúlio Prates (o motoqueiro).
 

*Werley Peres é médico de Família e Comunidade e pós-graduado em Psiquiatria.

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