O Afeganistão prometeu iniciar uma investigação minuciosa depois das críticas da comunidade internacional em função das revelações sobre casos de abusos sexuais da polícia contra menores de idade.
De acordo com a AFP, os talibãs usam os menores submetidos à prática tradicional do "bacha bazi" ("brincar com meninos" em dari, uma das duas línguas oficiais afegãs) pelos policiais para atacar a própria polícia.
Este tipo de ataque matou centenas de policiais nos últimos dois anos na província central de Uruzgan, onde a prática continua muito presente.
"O presidente Ashraf Ghani ordenou uma investigação minuciosa com base nestas informações", anunciou o palácio presidencial em um comunicado.
"Quem for considerado culpado será perseguido e punido, independente da patente, de acordo com o direito afegão e nossos compromissos internacionais", completa o texto.
A prática do "bacha bazi", que consiste em utilizar jovens pré-púberes como companhia sexual, para transportar armas ou servir chá, ainda é muito presente em algumas regiões do Afeganistão.
Suboficiais de polícia, juízes, funcionários do governo e sobreviventes revelaram à AFP como os talibãs recrutam os "bacha bazi" para atacar aqueles policiais que os violentaram, expondo assim os meninos aos abusos dos dois lados do conflito afegão.
A presidência destacou que "não há espaço" na sociedade afegã para estes agressores e que está disposta a tudo, "independente do preço", para que sejam punidos.
O anúncio foi feito depois de uma série de condenações internacionais em resposta a uma reportagem da AFP.
"Condenamos com veemência os espantosos abusos como os que são descritos na matéria", afirmou a embaixada dos Estados Unidos em Cabul.
"Estamos pressionando o governo afegão para proteger e a apoiar as vítimas e suas famílias. Pedimos à justiça que faça com que os culpados prestem contas", completou a representação diplomática.
Duncan Hunter, representante republicano no Congresso americano, pediu na semana passada "tolerância zero" e "medidas imediatas para impedir as violações de meninos na presença das forças americanas", ainda presentes no Afeganistão com quase 10 mil homens para apoiar e treinar as forças afegãs.
A Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão (Unama) afirmou que o "bacha bazi" é motivo de "grave preocupação" para a comunidade internacional.
"A Unama continua recebendo informações dispersas sobre o bacha bazi, inclusive dentro das forças de segurança afegãs, e vai cobrar do governo que todas as formas de abuso e de exploração dos meninos sejam punidas e prevenidas", afirmou à AFP Mark Bowden, representante especial adjunto da ONU no Afeganistão.
O anúncio do governo, que não divulgou um calendário preciso para as investigações, acontece a duas semanas das conferências para a renovação do compromisso internacional com o Afeganistão, no início de julho em Varsóvia e em setembro em Bruxelas.
Cabul tem uma grande dependência do apoio militar e financeiro internacional para a formação e manutenção das forças de segurança.
A falta de reação ao "bacha bazi" poderia colocar em perigo o apoio, afirmou Michael Kugleman, analista no Woodrow Wilson Center de Washington.
"Nenhum doador poderia justificar conscientemente financiar uma polícia associada a esta prática".
O ministério afegão do Interior reconhece que o "bacha bazi" é um grave crime e anunciou seu compromisso para reformar as instituições. Mas o país ainda não adotou uma legislação para punir a prática, nem anunciou qualquer iniciativa para ajudar as vítimas.