A superproteção e o capacitismo: o excesso de solidariedade que impede a autonomia da pessoa cega

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Foto: Roberto Barcelos

A superproteção e o capacitismo: o excesso de solidariedade que impede a autonomia da pessoa cega

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A sociedade, em muitas ocasiões, tem uma percepção equivocada sobre o tratamento
das pessoas com deficiência, principalmente aquelas que possuem limitações visuais.
A inclusão, por um lado, é uma conquista importante, mas, por outro, a forma de
abordar e tratar a pessoa cega pode ser um obstáculo para sua verdadeira integração.
Um dos maiores problemas que ainda persiste em muitas interações sociais é o
excesso de cuidado e solidariedade, muitas vezes disfarçados de respeito, mas que,
na verdade, carregam atitudes capacitistas que negam à pessoa cega o direito de
demonstrar suas reais capacidades.


Em muitos contextos, há uma tendência a tratar a pessoa cega com uma carga
excessiva de “ajuda”, que em vez de incentivar a autonomia e o protagonismo, reforça
a ideia de incapacidade. Quando alguém age com um excesso de cuidado, pode estar,
de maneira inadvertida, tratando a pessoa cega como alguém que precisa ser
constantemente assistido, como se fosse incapaz de realizar tarefas simples e
rotineiras. Esse tipo de abordagem, apesar de ser motivado por uma sensação de
solidariedade, muitas vezes acaba sendo uma forma de imposição de limitações sobre
o outro.


Um exemplo comum ocorre em espaços públicos, como no transporte coletivo. Ações
como pegar uma pessoa cega pela mão, sem antes perguntar se ela necessita de
ajuda, podem ser vistas como uma tentativa de “proteção”, mas na realidade são um
reflexo de uma visão capacitista que desconsidera a autonomia da pessoa cega. Ela
pode, muitas vezes, se sentir desrespeitada por não ser questionada ou consultada
sobre sua necessidade de ajuda, e, na maioria das vezes, deseja ser tratada de forma
igual aos outros cidadãos.
Nem sempre o excesso de cuidado significa respeito. O cuidado excessivo pode ser
um reflexo da visão estigmatizada da pessoa cega como uma figura fragilizada, que
precisa ser tratada com “piedade”. Essa atitude pode impedir que ela demonstre sua
competência e potencial para lidar com as situações cotidianas. A solidariedade,
embora bem-intencionada, precisa ser moderada, para não se transformar em uma
forma de condescendência. A pessoa cega não precisa de pena, mas sim de
compreensão e, principalmente, de oportunidades para mostrar suas habilidades.
A superproteção, em vez de ajudar, pode reforçar a ideia de que a pessoa cega está
permanentemente dependente da caridade dos outros. Isso enfraquece sua
autoestima e sua capacidade de se colocar no mundo como um sujeito pleno, capaz
de contribuir para a sociedade de forma independente. Em vez de agir com
comiseração, é necessário cultivar atitudes de respeito, que reconheçam a pessoa
cega como alguém com plenas condições de desenvolver suas atividades da mesma
forma que qualquer outra pessoa.


Para que a inclusão social de pessoas cegas se concretize de maneira eficaz, é
fundamental que a sociedade adote uma postura de empatia, e não de pena.
Compreender as necessidades reais da pessoa cega, respeitar suas escolhas e
apoiar a busca por soluções que promovam sua autonomia são atitudes muito mais
valiosas do que o simples “excesso de cuidado”. A verdadeira solidariedade está na
promoção de igualdade de oportunidades, e não no tratamento desigual que visa
“proteger” em vez de capacitar.


Em suma, é necessário repensar o modo como tratamos as pessoas com deficiência
visual. Respeito não significa superproteção, mas sim a capacidade de enxergar o
outro como um ser humano com os mesmos direitos e deveres que qualquer outra
pessoa. Ao valorizar a autonomia da pessoa cega e oferecer as oportunidades que
ela necessita para desenvolver suas atividades cotidianas, estamos, de fato,
respeitando sua dignidade e promovendo uma sociedade mais justa e inclusiva.


Por Débora Camila de Oliveira

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