A quilombola, a Caravana da Transformação e a retomada da independência

Dona Cirila Campos relata como retomou a rotina após a cirurgia - Foto por: José Medeiros

A quilombola, a Caravana da Transformação e a retomada da independência

Sentada aos pés de uma mangueira, descalça, Cirila Campos, de idade indeterminada, costura uma bermuda enquanto fala sobre as benesses de ter passado pela cirurgia de catarata oferecida na Caravana da Transformação. “Agora eu voltei a cortar a cebola do jeito que eu gosto, bem miudinha”.

Membro da comunidade quilombola Vão Grande, localizada a 40 quilômetros de Barra do Bugres (140 km de Cuiabá), a dona de casa exemplifica o esforço do governo em atender todos os cidadãos mato-grossenses, independente das dificuldades geográficas impostas a estas pessoas.

“Aqui a gente fica isolada, é tudo muito longe, e quando o rio tá cheio a gente só atravessa ele para poder ir a cidade de barco”, conta Cirila, que emenda: “eu não gosto do barulho da cidade, e pra mim foi muito bom poder voltar a enxergar de verdade, porque antes eu via tudo esfumaçado, e hoje eu faço as pequenas coisas que antes não conseguia, ou tinha dificuldade, como cuidar da casa”.

A quilombola fala, emocionada, que a retomada da independência é algo com o qual ela sonhava há muito tempo. “Hoje não preciso mais recorrer à minha filha, que mora em frente de casa, para fazer coisas que eu gosto, como costurar e cozinhar”.

Enquanto fala da nova vida, Cirila conversa com as galinhas, que junto aos pintinhos ciscam ao seu redor. Ali, a noção de tempo corre diferente do mundo exterior. “Eu não sei quantos anos tenho porque pra mim não faz diferença, mas a gente sabe que tá envelhecendo quando as vistas começam a falhar”.

Convidada a participar da conversa, sua filha Maria Campos se junta ao grupo, e questionada, também não sabe precisar a idade da mãe, tampouco a sua. “Minha mãe deve ter uns 70, 90 anos, e eu devo ter uns 50 e pouco”, lembrando que isso pouco importa, diante da felicidade que é ver sua mãe ter as rédeas de sua vida novamente.

“Minha mãe vivia trupicando, hoje ela já enxerga eu daqui do quintal, lá do outro lado da rua, e isso é bom porque a gente se preocupa menos com ela né, que inclusive até caiu esses tempos atrás porque não viu um degrau, ‘inté’ quebrou o braço”, recorda Maria.

A filha, que antes cuidava de todos os afazeres do lar da mãe, conta que a matriarca da família Campos seguiu todas as determinações do médico de forma correta, como fazer o uso do colírio nos horários indicados, não fazer nenhum esforço e não se abaixar, orientações que Mathias Alves da Silva, 87 anos, membro da mesma comunidade quilombola, não seguiu. “Eu tô com a vista escura porque, eu acho que é porque eu não lembrei de pingar o colírio”.

A verdade é que Mathias não cumpriu nenhuma das recomendações médicas. Morando sozinho, sempre se viu na obrigação de fazer todos os serviços do lar, como cortar lenha, alimentar os animais, mesmo tendo condições de receber auxílio de familiares e vizinhos, bem como contratar alguém para ajuda-lo.

“Nos já dissemos pro seo Mathias que ajudaríamos ele, mas ele é cabeça dura e nunca aceitou ajuda”, diz Maria Campos, filha de dona Cirila, vizinhos de Mathias. A isso soma-se o fato de Mathias ter se recusado a receber agente de saúde para que ela fizesse o acompanhamento de seu caso.

Contudo, após a visita da equipe multidisciplinar, Mathias entendeu a importância de obedecer as recomendações da equipe médica, e tímido, prometeu: “vou deixar de ser turrão e vou abrir a porteira pra dona da saúde que vem cuidar da gente”.

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